sexta-feira, 23 de maio de 2008

Sistema Digestivo Humano

Todos os animais são heterotróficos, tendo como única fonte de carbono moléculas orgânicas sintetizadas por outros seres. Os herbívoros alimentam-se de produtos vegetais, os carnívoros de outros animais ou produtos de origem animal e os omnívoros apresentam uma dieta mista.

Com pequenas variações, todos os animais necessitam dos mesmos nutrientes básicos (minerais, vitaminas, glícidos, lípidos e prótidos), que fazem parte dos alimentos mas geralmente em formas complexas, pelo que terão que ser digeridos antes de ser utilizados.

O conjunto de processos que ocorrem desde a ingestão dos alimentos até á sua utilização final nas células designa-se nutrição e é semelhante em todos os animais, onde existem células, cavidades ou órgãos especializados nesse processamento dos alimentos.

Introdução

A nutrição inclui as seguintes etapas:

  • Ingestão – alimentos são captados e introduzidos no corpo, por métodos variados, consoante o animal:

  • Filtração – animais aquáticos retiram partículas e células da água, fazendo-as aderir a superfícies cobertas de muco ou capturando-as com cílios ou apêndices plumosos;

  • Detritos – animais como os anelídeos alimentam-se de detritos orgânicos do solo ou fundos aquáticos;

  • Partículas sólidas – a maioria dos animais utiliza alimentos sólidos de origem animal e/ou vegetal, por vezes em pedaços grandes, necessitando de estruturas para os esmagar;

  • Alimentos líquidos – frequentemente animais parasitas alimentam-se exclusivamente de fluidos animais e/ou vegetais, embora tal não seja exclusivo deste tipo de animal;

  • Digestão – os alimentos contêm moléculas complexas que não podem ser absorvidas pelas células directamente, necessitando de ser hidrolisadas por enzimas. Esta etapa é essencialmente química, facilitado quando os alimentos são previamente triturados e fragmentados – digestão mecânica -, o que aumenta a área de contacto com as enzimas. A digestão pode ser:

  • Intracelular – existe em animais simples (poríferos, cnidários, platelmintes) e decorre em vacúolos digestivos de células especializadas;

  • Extracelular – representa uma importante vantagem evolutiva pois o animal pode ingerir em cada refeição maior quantidade de alimento, que é armazenado e digerido durante um período mais longo de tempo. Deste modo, o animal não necessita de se alimentar permanentemente. Neste caso, a digestão ocorre em cavidades digestivas, que, apesar de se encontrarem no interior do corpo, lhe são externas, representando um prolongamento do meio;

  • Absorção – após a digestão, as moléculas simples devem atravessar a membrana dos órgãos digestivos para o meio interno, seja directamente para as células ou através do transporte pelo sangue ou outros líquidos. Nas células os nutrientes vão ser transformados em ATP ou utilizados na biossíntese;

  • Egestão – eliminação de resíduos da digestão.

Nutrição

Os sistemas digestivos mais complexos apresentam zonas especializadas:

  • Região receptora – inclui a cavidade bocal e suas peças acessórias – mandíbulas, rádula, dentes, bico, língua (única dos cordados) - e a faringe, onde se realiza a deglutição. Na cavidade bocal é lançada a secreção das glândulas salivares, que lubrifica e facilita a deglutição, além de, em certos casos, iniciar a digestão química pela amilase. A saliva pode também apresentar substâncias tóxicas ou anticoagulantes;

  • Região de transporte e armazenamento – composta pelo esófago, na maioria dos animais corresponde apenas a uma região de passagem dos alimentos em direcção á zona digestiva, mas pode apresentar uma dilatação – papo -, onde o alimento é armazenado antes da digestão;

  • Região de digestão e absorção – composta pelo estômago e intestino delgado. Em muitos vertebrados e alguns invertebrados é no estômago que se inicia a digestão química, misturando os alimentos com sucos digestivos. Pode existir um “estômago mecânico”, a moela. Nos animais com estômago simples, o intestino completa a digestão e realiza a absorção;

  • Região de absorção de água e concentração de resíduos – composta pelo intestino grosso, onde os resíduos não digeridos se tornam mais consistentes, á medida que a água vai sendo absorvida. As fezes sólidas daí resultantes são expulsas por egestão. A reabsorção de água é particularmente importante em insectos, répteis e aves, cujas fezes são quase secas, tornando-os bem adaptados á vida em meio seco.

Zonas do tubo digestivo

Os sistemas digestivos evoluíram no sentido do aproveitamento mais eficaz dos alimentos ingeridos, podendo ser uma simples cavidade ou apresentar diferentes órgãos especializados.

Este tipo de sistema digestivo tem vantagens adaptativas, nomeadamente, os alimentos deslocarem-se num único sentido, sofrendo alterações sequenciais e aumentando o aproveitamento dos alimentos. É igualmente vantajoso que os resíduos possam ser armazenados algum tempo antes de ser expulsos através do ânus.

Como exemplos das principais etapas da evolução do sistema digestivo analisaremos os seguintes animais:

Evolução dos sistemas digestivos

Nestes animais existe apenas uma cavidade gastrovascular, com uma única abertura, que funciona simultaneamente como boca e ânus – sistema digestivo incompleto.

A digestão inicia-se na cavidade com a ajuda de enzimas digestivas produzidas pelas células glandulares da gastroderme. As partículas semidigeridas são depois fagocitadas e a hidrólise é completada em vacúolos digestivos – digestão intra e extracelular.

Os nutrientes difundem-se para o corpo, enquanto os resíduos são exocitados e devolvidos á cavidade gastrovascular, donde vão para o exterior.

Cnidários

O tubo digestivo é incompleto, apenas com uma abertura, que é a boca, embora funcione igualmente como ânus. Nestes animais o intestino é muito ramificado, logo nenhuma célula está muito longe do tubo digestivo, aumentando a área de digestão e a distribuição eficaz dos alimentos.

Existe alguma diferenciação, apesar de não existirem órgãos especializados, pois a faringe projecta-se para fora da boca, ajudando à ingestão de alimentos.

Tal como nos cnidários, a digestão é intra e extracelular.

Platelmintes

Nestes animais o tubo digestivo é completo, com duas aberturas terminais (boca anterior e ânus posterior) e está diferenciado em regiões especializadas, que realizam uma digestão extracelular.

O tubo digestivo é formado por:

  • Boca;

  • Faringe – órgão musculoso, que suga os alimentos;

  • Esófago – tubo de passagem;

  • Papo – zona de armazenagem de alimentos;

  • Moela – como o animal não tem dentes, este compartimento realiza a digestão mecânica, com a ajuda de pequenas pedras;

  • Intestino – local de realização da digestão química, bem como da absorção. A absorção é facilitada pelo aumento de área que a presença da prega dorsal tiflosole fornece;

  • Ânus.

Anelídeos
Estrutura do sistema digestivo de uma ave granívora

Tal como em todos os vertebrados, nas aves o tubo digestivo é completo, com dois órgãos anexos muito importantes – fígado e pâncreas.

O tubo digestivo propriamente dito está dividido nos seguintes compartimentos:

  • Boca;

  • Esófago;

  • Papo – dilatação a nível do esófago, onde os alimentos são armazenados e amolecidos;

  • Proventrículo – primeira divisão do estômago, onde é segregado suco gástrico com enzimas;

  • Moela – segunda divisão do estômago, muito musculosa e que mói completamente os alimentos, com a ajuda de pedras e areia que o animal ingere;

  • Intestino – local onde decorre a absorção e onde são lançadas as secreções do fígado e pâncreas;

  • Ânus – localizado na cloaca, não abrindo directamente para o exterior.

Aves

Os mamíferos necessitam de uma dieta nutritiva e abundante pois os custos metabólicos da manutenção de temperatura são muito elevados, mas de acordo com o regime alimentar, o tubo digestivo pode apresentar adaptações específicas.

Nos carnívoros o aparelho digestivo é simples pois as proteínas, lípidos e sais minerais que se encontram na carne não necessitam de digestão especializada.

Nos omnívoros o estômago é um saco de paredes musculosas e com glândulas produtoras de ácido clorídrico e enzimas. A parede do estômago não é destruída por estes fluidos devido à protecção da mucina, outra secreção gástrica.

As plantas contêm glícidos complexos, como a celulose. Assim, nos herbívoros o intestino é proporcionalmente maior, pois os vegetais são menos nutritivos e de digestão difícil. Dado que nenhum vertebrado produz enzimas capazes de hidrolisar este polissacárido muitos herbívoros albergam bactérias em diversos compartimentos, nomeadamente no ceco ou no próprio estômago, que nesse caso é subcompartimentado:

  • rúmen – onde se localizam as bactérias capazes de fermentar a celulose, que se reproduzem a uma taxa suficientemente elevada para compensar as que são "perdidas" com a deslocação do bolo alimentar. O conteúdo deste compartimento (bactérias e material vegetal) é regurgitado regularmente para a boca, quando o animal, num local seguro, mastiga demoradamente o alimento ingerido apressadamente;

  • retículo - igualmente rico em bactérias fermentativas, recebe o bolo alimentar depois de remastigado na boca, permitindo uma maior área de ataque às celulases bacterianas;

  • omaso - a pasta alimentar contendo enorme quantidade de bactérias fermentativas é "concentrada", devido à reabsorção de água;

  • abomaso - compartimento correspondente ao estômago nos restantes mamíferos, secreta ácidos e proteases que completam a digestão da forma tradicional.

Deste modo, estes animais ingerem maiores quantidades de alimentos, que permanecem muito tempo no tubo digestivo. Este método digestivo é muito eficiente para uma dieta pobre em proteínas, pois as próprias bactérias são igualmente digeridas tornando-se uma fonte de proteínas para o ruminante (uma vaca pode obter cerca de 100 g de proteínas por dia da digestão das suas bactérias endossimbióticas).

Alguns herbívoros não ruminantes, como os coelhos e lebres, também contêm a sua própria flora fermentativa, geralmente em divertículos especializados - ceco. No entanto, como o ceco abre no intestino grosso a absorção de nutrientes digeridos pelos microrganismos é pouco eficaz e incompleta. Para o compensar, muitos destes animais ingerem as suas fezes - coprofagia. Existem geralmente dois tipos de fezes nestes casos, um composto exclusivamente por detritos e outro, que é ingerido directamente do ânus, composto por material cecal, que irá então passar pelo estômago e intestino delgado, sendo os seus nutrientes absorvidos.

O dióxido de carbono e o metano são produtos secundários do metabolismo fermentativo destas bactérias, podendo um ruminante típico (uma vaca, por exemplo) produzir até 400 litros de metano por dia. Este facto torna o gado doméstico a segunda mais importante causa do efeito de estufa na Terra (logo após a industria).

O tamanho do animal é decisivo no tipo de dieta, e, logo, no tipo de sistema digestivo que irá apresentar. Nos pequenos mamíferos a razão área/volume é elevada, significando que perdem grande quantidade de calor para o meio. Assim, devem apresentar grandes necessidades calóricas e metabolismo elevado. Como não poderão tolerar uma digestão lenta como a dos herbívoros, os mamíferos com menos de 500 g são quase todos insectívoros.

Pelo contrário, os mamíferos de maior porte geram mais calor e perdem menos calor, tolerando um processo de recolha de alimento mais demorado (carnívoros que atacam presas de grande porte) ou uma digestão lenta (herbívoros). Além disso, animais com mais de 500 g não conseguiriam recolher uma quantidade de insectos suficiente durante o dia. A única excepção são os mamíferos que se alimentam de grandes quantidades de insectos coloniais (formigas ou térmitas).

O tubo digestivo humano pode ser considerado típico da classe dos mamíferos. O alimento introduzido na boca progride no tubo pelos movimentos peristálticos involuntários.

Embora a digestão se inicie na boca, é no estômago e intestino delgado que ela se processa, com intervenção de grande variedade de enzimas. Estas são produzidas por glândulas gástricas e intestinais, além de órgãos anexos como as glândulas salivares, pâncreas e fígado (a bílis não apresenta, no entanto, enzimas).

A absorção é facilitada pela presença no intestino delgado de pregas – válvulas coniventes – cobertas com vilosidades intestinais em forma de dedo de luva, cujas células epiteliais ainda apresentam microvilosidades. Todo este conjunto aumenta grandemente a área de contacto entre os alimentos e a parede, facilitando a absorção, que se realiza por difusão ou por transporte activo.

Mamíferos

Habitat

Tubo digestivo

Compartimentos

Órgãos anexos

Tipo de digestão

Platelmintes

Água doce

Incompleto

Cavidade gastrovascular

-

Intra e extracelular

Anelídeos

Aquático ou terrestre

Completo

Faringe, esófago, papo, moela, intestino com tiflosole

-

Extracelular

Insectos

Terrestre

Completo

Faringe, esófago, papo, estômago, intestino e recto

Glândulas salivares, cecos gástricos

Extracelular

Peixes cartilagíneos

Água salgada

Completo

Faringe, esófago, estômago, intestino delgado e intestino grosso

Glândulas salivares, fígado e pâncreas

Extracelular

Peixes ósseos

Aquático

Completo

Faringe, esófago, estômago, intestino delgado e intestino grosso

Fígado e pâncreas

Extracelular

Anfíbios

Água doce e terrestre

Completo

Faringe, esófago, estômago, intestino delgado e intestino grosso

Fígado e pâncreas

Extracelular

Répteis

Terrestre

Completo

Faringe, esófago, estômago, intestino delgado e intestino grosso

Glândulas salivares, fígado e pâncreas

Extracelular

Aves

Terrestre

Completo

Faringe, esófago, papo, proventrículo, moela, intestino delgado e intestino grosso

Glândulas salivares, cecos intestinais, fígado e pâncreas

Extracelular

Mamíferos

Aquático ou terrestre

Completo

Faringe, esófago, estômago, intestino delgado e intestino grosso

Glândulas salivares, cecos intestinais, fígado e pâncreas

Extracelular

Quadro resumo dos sistemas digestivos de alguns animais